domingo, 26 de dezembro de 2021

Feliz Natal!



Amado Menino Jesus,


Por que o Presépio não envelhece? Há dois milênios o senhor nasceu entre nós, um bebê miúdo, o mais lindo que os homens já conheceram. E miúdo o senhor prossegue, pequeno e carente, pedindo o seio da mãe, o colo do pai. A cada ano o Presépio anuncia que o Evangelho não envelhece, que a fé cristã é antiga mas também é nova, nasceu na Palestina e espalhou sementes de amor nos corações mergulhados em trevas. O que era sombra em nós foi iluminado pela doce coragem do seu sorriso. Eis que tudo se fez novo.


Mas permanece velho. Por que o senhor não envelhece, tomado pelas cinzas dos milênios? Por que a cada dia santo de Natal o seu tamanho nada diz de uma imensidão distante de um Deus ausente, mas me humilha porque é do meu tamanho, da exata medida da minha miséria? Por que Deus nasceu? Era preciso?


Eu preciso lhe dizer que caminhei muito até chegar aqui, com a mente abarrotada de medos e de perguntas. Ontem mesmo eu me perdi no deserto, acredita? E um homem estranho e frio me encontrou recostado entre areia e céu, mirando o nada absoluto que o vazio havia tecido no meu coração, e o verme imbecil que eu havia me tornado. Um homem de olhar dissimulado, mas quase convincente. Ele me disse para voltar pelas mesmas vielas inúteis que me trouxeram ali, porque era torpe demais esperar um Deus entre nós. Mas eu insisti quando percebi que o homem era um lobo metido em roupas de pastor de ovelhas. Ele fugiu ao ver a minha coragem para prosseguir.


O senhor nasceu, e eu morri. E eu nem sabia que era tão doce morrer diante de um bebê que me rasgou inteiro, que me fez pó e lama, para que eu soubesse que é tudo mentira, que aquele lobo engana por ofício próprio, que ele nos faz crer que somos deuses. Na verdade, somos ídolos com canelas de barro, arruinados. O lobo é o pai da cegueira. Ele não quer que vejamos que o senhor, o doce Menino Jesus, é o Deus que reina soberano pelo amor, pelo perdão, pela esperança. E nasceu sem coroa ou cetro.


Eu tive medo de entrar, preciso admitir. Nunca entendi nada, e aquilo era demais para a minha consciência. Entrei no Presépio e não ouvi mais nada. O silêncio era de uma força acusatória que me lançou ao chão. Eu precisei encontrar uma forma de estar ali, e me ajoelhei. O tempo passou, e a minha vida estava escrita nos olhos do senhor de uma forma que ninguém nunca havia me narrado. Não havia o ódio que tanto me caracteriza, nem o rancor, nem a dúvida. Era como um teatro, a minha vida inteira lançada no bendito olhar do Deus Menino. E o senhor não me condenava. Eu não entendi, porque é justamente condenar o que eu adoro fazer. O senhor me olhou, me tocou, me pediu colo.


Permaneci em silêncio, e gritei labaredas impetuosas na minha mente atordoada, clamando por amor, qualquer mísera gota de amor que pudesse me salvar. E recebi oceanos infindáveis de amor, paz, carinho. O Presépio me salvou. Eu pedi uma gota, e ele me deu tudo.


Menino Doce e Terno, estende as mãos e cura este mundo perdido nas trevas.


Luiz Andrada


Natal de 2021


Thomas Jefferson against Calvinism