quarta-feira, 9 de junho de 2021

O corpo da mulher: uma isca publicitária

O corpo da mulher: uma isca publicitária


Luiz Andrada

9 jun. 2021

luizandradabh@gmail.com





Enquanto leio as versões digitais dos jornais, encontro diariamente, e numa insistência obstinada, a completa vulgarização do sexo feminino no espaço midiático. A mulher foi transformada em algo menos do que uma minhoca morta, pendurada numa vara a fim de atrair o peixe, o consumidor. A pornografia da mídia tornou-se tradição, um roteiro sagrado e obrigatório, e a mulher tornou-se uma espécie de sacerdotisa embriagada de si mesma, exalando narcisismo, vaidade, endeusamento, arrogância. Um cenário deprimente.


As chamadas nos jornais sempre realçam a bunda e os seios. Esse esquartejamento é perpetrado pela elite dos publicitários, que domina como ninguém a arte podre de mesclar comércio e sexo. Isso sempre funciona, isso sempre vende. Um intenso impulso natural no ser humano é manipulado com mero intuito financeiro. Uma bunda vale um produto de 500,00 reais, suponho. Um par de seios vale aquela viagem anunciada na página do jornal, cerca de 2.000,00 reais. O pacote bunda e peito sai por 2.500,00 reais. Aproveite! É promoção! Quer que embale pra levar? Marmitex?


O foco de análise não deve ser apenas a pornografia da matéria sobre essa ou aquela futilidade (também chamada de celebridade). Não. A dondoca futilidade é mera isca. O sexo é usado para motivar o leitor a entrar naquela página repleta de anúncios publicitários. A lógica é simples: o corpo da mulher vale certo montante de reais. E muitas mulheres se submetem a isso, porque o narcisismo do sexo feminino é algo quase onipotente. Ela pode tudo, porque tem tudo, ou melhor, porque tem todos os dotes sexuais exaltados pela mídia. O publicitário manipula a vaidade da mulher assim: “Você é maravilhosa! Vamos tirar algumas fotos picantes, e amanhã o Brasil inteiro vai idolatrar você!”. Isso é como uma prece na mente dessas mulheres. Uma proposta irrecusável.


“Fulana posou de biquíni fininho! Uau! Você viu? Veja!”, “Fio-dental cavadíssimo de Fulana rouba a cena nos bastidores!”, “Antes e depois: veja como ficou o corpo da Fulana”, “Funkeira faz tatuagem no ânus e na vagina! Você viu? Quer ver? Primeiro, tape o nariz, ok?” (o deboche aí é por minha conta), “Menina de apenas 14 anos arrebata corações exibindo corpão de mulher, num fio-dental majestoso e enfiadinho! Você viu? Quer ver?”. E muitos outros exemplos o leitor poderá encontrar numa rápida pesquisa pela internet. Em outras oportunidades, eu escrevi alguns breves artigos sobre a vulgarização da mulher que também se manifesta na música, no funk. Para quem se interessar, aqui estão:


Sabia? Ela fez tatuagem no ânus e na vagina!


A atual decadência da música brasileira em um parágrafo


Funkeiras: prostitutas no palco


Essa é a mesma mídia, por exemplo, que denuncia a exploração sexual de menores, a pedofilia, o abuso sexual, a importunação sexual. É uma síndrome de hipocrisia perversa e diabólica. De manhã os midiáticos são os mocinhos, bonzinhos, corretinhos. De noite o lobisomem aparece. De manhã condenam a pedofilia. De noite os programas de auditório recebem crianças seminuas cantando e dançando o funk pornográfico. E a lista de misérias da mídia se estenderia ad infinitum se eu prosseguisse elencando aqui neste curto espaço.


As feministas de antigamente devem estar surtando em crises de ódio e de pânico, dentro de suas tumbas, diante do lamaçal no qual a mulher moderna despencou, após séculos de luta pela dignidade, valor, respeito da mulher. Não que eu concorde com todas as pautas do feminismo, é claro que não. Mas, testemunhar uma mulher que sente prazer em cumprir o papel de minhoca, de isca publicitária, expondo seus intestinos numa pornografia criminosa, num desespero atroz por qualquer dinheiro, incentivando as novas gerações a percorrerem o mesmo caminho perverso; enfim, é algo a se lamentar profundamente. E digo mais: essa mídia, essa publicidade imunda, deveriam ser submetidas a leis que protejam os menores de idade. Porque todo esse material é tóxico, pernicioso e venenoso, e a nossa sociedade colherá os frutos da redução do homem e da mulher aos seus genitais. Nem porco chega a ser tão vulgar. Nem porco.



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